sábado, 9 de abril de 2011

A boa gestão de uma igreja

Rodolfo Garcia Montosa
Publicado em 25.09.2006


Para começar, o que é gestão? Os livros e a internet estão repletos de conceitos e definições. Muitos, ao ouvirem esta palavra, têm a impressão de estarem diante de um quebra-cabeça de muitas e muitas peças. O Aurélio procura simplificar ao apontar a palavra administração como sinônimo de gestão. Alguns autores, no entanto, entendem que administração possui uma conotação diferente da gestão, já que esta, mais recentemente, passou a significar a interferência direta e ampla nos sistemas e procedimentos organizacionais. Neste sentido, gestão poderia ser definida como o gerenciamento do conjunto de ações e estratégias nas organizações, de maneira ampla, visando atingir seus objetivos.

E para a Igreja? O que é gestão? Minha definição é de que gestão é o exercício da liderança na direção da missão, com o foco em pessoas, dentro dos princípios e valores que se preconiza, com boas técnicas e procedimentos, fazendo acontecer os resultados que se tem como alvo.

Esta definição está apoiada em um dos textos que fundamentam o Instituto Jetro que é Salmos 78.72. Na versão NVI lemos “E de coração íntegro Davi os pastoreou; com mãos experientes os conduziu” e na versão VRA lemos “E ele os apascentou consoante a integridade do seu coração, e os dirigiu com mãos precavidas”. Estes textos falam de duas dimensões na gestão: a dimensão do coração e a dimensão do entendimento. A dimensão do coração engloba as intenções, os reais valores, a centralidade, os reais objetivos pessoais e coletivos, as paixões, o que realmente amamos, a fidelidade, o caráter. Já a dimensão do entendimento engloba o como fazemos, as técnicas que usamos, os hábitos, a observância da lei da gravidade, a prudência, a experiência, a competência.

O coração remete ao caráter e o entendimento remete à competência. Caráter X Competência: com qual dos dois devemos prosseguir? Com os dois! Eles são interdependentes, não podem caminhar sozinhos na vida da igreja. Nem sozinhos, nem desequilibrados. O caráter e a competência devem caminhar juntos e equilibrados pelo poder de Deus. Então, se entendemos assim e nos apoiamos na necessidade de investirmos no nosso coração (caráter) e no nosso entendimento (competência), temos uma base sólida para nos apoiarmos em busca de uma solução para o nosso quebra-cabeça de gestão. Isto porque, a partir de alicerces bem fundamentados, partimos para ações que, de fato, vão fazer acontecer a boa gestão de uma igreja.

Antes que você se sinta desmotivado frente ao desafio de juntar tantas peças, informo que o quebra-cabeça proposto aqui é formado por 6 peças somente. Elas seriam as peças maiores. Elas englobam várias outras peças menores, mas, uma vez manipuladas, desencadeiam o processo de encaixe do quebra-cabeças inteiro. Para cada peça apresentaremos um conceito juntamente com perguntas de reflexão e auto-análise que podem nos ajudar a manipular melhor aquela peça.

Visão

Aqui adotamos o conceito de George Barna que afirma: “é um retrato mental claro de um futuro preferível, comunicado por Deus a seus servos-líderes escolhidos, baseado num entendimento real de Deus, de si mesmos e das circunstâncias”. A visão nos fornece o rumo, engaja e motiva pessoas, ajuda nas decisões, sustenta na turbulência.

• Sei onde quero chegar em um ano, no próximo ano e daqui a cinco anos?
• Sei onde estou na caminhada?
• Sei o que está me desviando do alvo?
• Sei o que devo fazer para corrigir a rota?
• Observo e aprendo com a minha experiência e com a dos outros?

Pessoas

Toda a obra de Cristo foi por causa de pessoas e sua continuidade é através de pessoas. Mcgregor propõe a Teoria XY, a partir da qual analisa que toda a direção de uma organização está baseada na real concepção que temos acerca da natureza humana.[1] A forma como vemos os membros da igreja determina o nosso estilo de liderança que pode variar de participativo de um lado a autoritário no outro extremo. Adaptando a teoria, o estilo de liderança Y entende que os membros são motivados e querem servir, por isso, a liderança é mais participativa-consultiva e os relacionamentos são interdependentes. Já o estilo de liderança X entende que os membros querem ser servidos e evitam a responsabilidade a fim de se sentirem mais seguros. Por isso, esta liderança tende ao estilo autoritário-benevolente onde os relacionamentos são mais superficiais e condescendentes.

• Estou convencido de que tenho bons critérios para selecionar pessoas para funções chaves?
• Ao designar pessoas para as funções, tenho um bom programa de treinamento?
• Sou transparente em relação ao desempenho dos meus liderados, seja ele satisfatório ou não?
• As pessoas que trabalham comigo se sentem alegres e motivadas?
• Consigo discernir ovelhas de lobos e tratá-los adequadamente?

Pensamento sistêmico

Segundo Scholtes, “o pensamento sistêmico refere-se ao reflexo geral ou hábito de conceber a realidade em termos de interdependência, interações e seqüências”[2]. Sistemas são compostos por processos, os quais são compostos por métodos, que se subdividem em passos. Um exemplo seria uma igreja em células. Se partirmos da igreja como um sistema, teremos dentro do subsistema de células o processo de discipulado, com o método individual e orientado, cujos passos podem ser resumidos em ter uma reunião semanal para comunhão, estudo e oração. Uma boa analogia é a Igreja comparada ao corpo humano que é composto de muitos sistemas interdependentes e inter-relacionados.

• Tenho reações efetivas quando percebo falhas em processos que impactarão no futuro?
• Consigo relacionar o crescimento da igreja com outros processos bem desempenhados?
• Consigo compreender a relação entre a estagnação em determinadas áreas ou ministérios com processos mal conduzidos?
• Observo atentamente o impacto das ações nos ministérios e departamentos da igreja?
• Consigo enxergar os efeitos de longo prazo de um discipulado saudável?

Aprendizagem

Na década de 90, Senge popularizou este conceito e se tornou um dos autores que mais publica nesta área. Ele afirmou “para sobrevivermos aos desafios da mudança contínua é fundamental que nos tornemos uma organização de aprendizagem. Não somente uns detendo o poder da informação, mas todos tendo o ambiente e oportunidade para se desenvolverem”[3]. É fato que as empresas ou organizações aprendem à medida que os seus colaboradores vão ganhando novos conhecimentos. Aquelas que se mantém em contínua adaptação e melhoria são chamadas de organizações que aprendem.

• Meu estilo de liderança incentiva a aprendizagem e desenvolvimento das pessoas?
• Estimulo a individualidade e a criatividade sabendo que a diversidade é uma grande riqueza?
• Estou comprometido em aprender coisas novas?
• Estou consciente de que devo desaprender algumas coisas, ainda que isto seja difícil?
• Estou convicto de que somos mais capazes coletivamente em Deus do que individualmente?

Recursos

Uma interessante conceituação neste assunto vem de Scholtes: “devemos saber identificar com precisão quais são os recursos que exercem impacto na precisão, acuidade, amplitude, tempo e na excelência das atividades que devemos desempenhar para cumprirmos nossa missão”. Recursos espirituais, humanos, patrimoniais e financeiros são provisão de Deus para a caminhada e devem estar, todos, alinhados com a visão.

• Estou convicto de que Deus é o Senhor absoluto e não deixará faltar nada?
• Estou convencido de que os recursos seguem a visão e as pessoas?
• A aplicação dos recursos está alinhada com a visão?
• Estou prestando contas às pessoas e a Deus sobre a aplicação de todos os recursos?
• A aplicação dos recursos está equilibrada com as áreas de necessidade?

Comunicação

Kotler afirma que “Toda a organização deve comunicar-se eficazmente com seus diversos públicos-alvo considerando, para isso, nove elementos inerentes a esse processo: emissor, receptor, mensagem, canal, codificação, decodificação, resposta, feedback e o ruído”[4].Na Igreja o líder tem o papel de emissor e receptor em relação aos liderados e à Deus. Tem que saber falar e saber ouvir. E mais que isso, o líder deve se preocupar não somente em buscar uma comunicação estruturada envolvendo os elementos acima como também, no papel de emissor, usar de simplicidade, clareza, interesse e repetição.

• Estou ouvindo a Deus com clareza, juntamente com outros irmãos?
• Estou ouvindo os liderados com a devida atenção?
• Estou comunicando claramente a visão de forma que todos possam reproduzi-la?
• Os líderes da igreja estão falando e ouvindo de maneira compreensível e equilibrada?
• Há comunicação entre a igreja e a comunidade local?

Ao repassar com honestidade por estas principais peças do quebra-cabeça, certamente você identificou áreas de oportunidade que precisam ser repensadas, reaprendidas, revisadas. Meu conselho é este: não se desespere. No livro de Tiago lemos uma instrução útil para este momento: "se alguém tem falta de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá liberalmente". Vamos depender da sabedoria que vem do alto e seguir confiantes como colaboradores da missão que é dEle mesmo.

[1] Douglas McGregor, The Human side of the entrerprise. Nova York: McGraw-Hill, 1.960.
[2] Peter R. Scholtes, O Manual do Líder: um guia para inspirar sua equipe e gerenciar o fluxo de trabalho no dia-a-dia. Rio de Janeiro: QUALITYMARK, 1.999
[3] Peter Senge, Learning Organization.
[4] Philip Kotler, Administração de Marketing: análise, planejamento, implementação e controle. São Paulo: Atlas,1.998.

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